Rússia perde mais de mil soldados por dia para avançar apenas poucos quarteirões, indicando possível esgotamento militar
Três anos após o início da invasão à Ucrânia, a Rússia enfrenta uma equação militar cada vez mais insustentável. Dados de inteligência ocidental revelam que o país perde em média 1.135 soldados mortos ou feridos diariamente para conquistar apenas 2,3 quilômetros quadrados de território – uma área que pode ser percorrida de bicicleta em poucos minutos.
Esses números expõem uma realidade que contrasta com as ambições iniciais de Moscou. Se Putin inicialmente planejava conquistar toda a Ucrânia, depois reduziu o objetivo para quatro regiões específicas, hoje suas forças lutam há mais de um ano apenas para tomar a cidade de Pokrovsk.
Uma guerra de desgaste insustentável
Analistas militares calculam que, no ritmo atual de avanço, a Rússia levaria 91 anos para criar a zona tampão que alguns funcionários russos propõem. “A Rússia está tomando território, mas a um custo insustentavelmente alto”, avalia Richard Barrons, ex-chefe militar britânico.
A diferença crucial, segundo especialistas, está entre “empurrar o inimigo” e “explorar uma ruptura”. Enquanto a Rússia ainda consegue forçar recuos táticos de 5 a 10 quilômetros, perdeu a capacidade de romper completamente as defesas ucranianas para avanços significativos.
“É uma conta muito grande em termos de equipamento que eles precisam. E eu simplesmente não vejo essa concentração em lugar nenhum”, explica Dara Massicot, especialista em guerra russa.
Confira nossa análise em vídeo:
O problema dos números
A matemática militar russa apresenta contradições evidentes. O país produz 200 tanques novos por ano, mas perde 1.400 anualmente no conflito – uma proporção de sete tanques destruídos para cada um que sai da fábrica.
Para compensar essas perdas, Moscou tem recorrido aos estoques da era soviética, reformando equipamentos que estavam em depósitos desde os anos 1980. Contudo, esses estoques se aproximam do esgotamento, com previsões indicando que acabarão entre meados de 2025 e o final do ano.
Jack Watling, do Instituto Real de Serviços Unidos de Londres, observa que “mesmo que os russos continuem lutando, tudo indica que sua força se tornará cada vez mais desmotorizada ao longo do tempo.”
Dependência externa crítica
Outro ponto vulnerável é a dependência de fornecedores externos. Segundo a inteligência ucraniana, 80% dos componentes eletrônicos dos drones russos vêm da China. Oleh Ivashchenko, chefe da inteligência ucraniana, revelou que a China fornece produtos químicos, pólvora e componentes para pelo menos 20 fábricas militares russas.
Essa dependência contradiz a narrativa de autossuficiência militar russa e demonstra que, sem parceiros como China e Coreia do Norte, a máquina de guerra de Putin enfrentaria sérias limitações.
A estratégia dos drones
Diante das limitações terrestres, a Rússia mudou sua abordagem militar. Funcionários ocidentais estimam que 80% das baixas no campo de batalha agora resultam de ataques de drones, não de combate tradicional. Em maio, a Rússia enviou 298 drones e 69 mísseis em um único dia contra alvos ucranianos.
Embora impressionante em escala, essa estratégia tem limitações fundamentais. Drones podem causar destruição e terror, mas não conquistam território de forma permanente. Para isso, são necessários soldados no terreno, apoiados por tanques e veículos blindados – exatamente o que a Rússia está perdendo rapidamente.
A escassez de equipamentos chegou ao ponto de soldados russos utilizarem motocicletas para atacar posições ucranianas, evidenciando a falta de veículos blindados adequados.
A resposta ucraniana
Reconhecendo essa vulnerabilidade, a Ucrânia construiu uma zona defensiva de 16 quilômetros repleta de minas e drones ao redor do território disputado. A estratégia é simples: forçar os russos a entrar nessa “zona de extermínio” e sangrar suas forças até o esgotamento.
O conceito de culminação
Especialistas militares introduzem um conceito crucial para entender o momento atual: a culminação. Diferente de um colapso súbito, culminação ocorre quando uma força militar atinge o máximo de sua capacidade ofensiva.
“A Rússia está culminando. É muito improvável que o exército russo tenha equipamento, pessoas, treinamento e logística para montar uma ofensiva que quebre a linha ucraniana”, argumenta Richard Barrons.
Pressões econômicas crescentes
O esforço de guerra cobra um preço econômico severo. A Rússia destina 150 bilhões de dólares para defesa em 2025 – 40% de todo o orçamento federal. O fundo nacional de riqueza pode se esgotar até dezembro.
Com inflação acima de 10% e taxa de juros em 21%, a economia russa opera próxima da capacidade máxima, uma situação considerada insustentável a longo prazo.
Perspectivas para 2025
Funcionários europeus de inteligência suspeitam que Putin pode estar recebendo informações filtradas, com subordinados relatando apenas o que ele quer ouvir. Se confirmado, isso significaria que decisões estratégicas estão sendo tomadas com base em avaliações incorretas sobre a força do próprio exército.
O ano de 2025 emerge como potencialmente decisivo. Se a Ucrânia conseguir resistir até o esgotamento completo dos estoques soviéticos, se o apoio ocidental se mantiver e se as pressões econômicas continuarem crescendo, a dinâmica do conflito pode mudar significativamente.
Mesmo que a Rússia não consiga seus objetivos na Ucrânia, isso não garante vitória automática ucraniana. O país emergirá do conflito fundamentalmente mudado – mais fraco em muitos aspectos, mas com experiência brutal em guerra moderna, especialmente em operações com drones.
O que se observa não é um colapso imediato, mas a degradação sistemática de uma máquina de guerra que parece ter atingido seus limites. A matemática é clara: a Rússia não pode sustentar indefinidamente perdas de mais de mil soldados diários para ganhos territoriais mínimos, nem produzir equipamentos na velocidade necessária para repor as perdas.
Contudo, Putin ainda pode causar danos consideráveis antes que essa realidade o force a reconsiderar sua estratégia. Os próximos meses serão cruciais para determinar se essa guerra de desgaste levará a uma mudança fundamental no conflito ou se prolongará o sofrimento sem resolução definitiva.